Parque Natural de Montesinho: Um Roteiro pelos Encantos do Nordeste Transmontano
- Catarina Araújo

- há 5 dias
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Bem-vindos à Terra Fria Transmontana
A um passo de Espanha, no extremo nordeste de Portugal, entre montanhas, rios e aldeias de pedra que parecem suspensas no tempo, vive um dos segredos mais bem guardados do nosso país: o Parque Natural de Montesinho. Localizado no distrito de Bragança, este parque é uma ode à natureza, à tradição e à vida de montanha.
Criado em 1979, é um dos maiores parques naturais de Portugal, com cerca de 75 mil hectares, estendendo-se desde o concelho de Bragança até ao de Vinhais. Aqui, a paisagem é moldada por séculos de convivência entre o ser humano e o meio natural.
A serra de Montesinho estende-se entre Portugal e Espanha. O seu ponto mais alto em território português atinge os 1.486 metros de altitude, o que faz desta uma das serras mais elevadas do norte do país.
Um santuário da biodiversidade
Com um relevo acidentado e microclimas que dão abrigo a uma impressionante variedade de espécies, o Parque Natural de Montesinho concentra 80% dos mamíferos em Portugal. Veados, javalis, corços, lontras habitam este santuário, assim como um dos símbolos mais icónicos da fauna ibérica: o lobo-ibérico.
De setembro a novembro, é a época da Brama dos Veados, o seu ritual de acasalamento. Ao amanhecer e ao cair da noite, os machos ocupam zonas mais abertas, libertando sons guturais poderosos para atrair as fêmeas e intimidar rivais. E quando o chamamento vocal não basta, seguem-se confrontos físicos, onde as hastes se entrelaçam num esforço de força e resistência. Para quem gosta de observar a natureza, a brama dos veados em Montesinho é um espetáculo imperdível, e uma das melhores experiências de outono no Parque.

Montesinho também é morada para mais de 150 espécies de aves. Se tiveres paciência e uns binóculos, podes ver águia-real, abutre-do-Egipto, cegonha-preta, melro-das-rochas, entre tantas outras.
Os répteis também estão bem representados. Há 18 espécies registadas, incluindo algumas raridades como a víbora-cornuda e o lagarto-de-água. Nada menos que 50% dos endemismos ibéricos ocorrem nesta área, o que diz muito sobre a sua importância ecológica.
A Flora de Montesinho
A paisagem vegetal é dominada por carvalhais de carvalho-negral (Quercus pyrenaica) e soutos de castanheiros, muitos deles centenários. E ao longo dos cursos de água, surgem as galerias ripícolas com azevinhos (Ilex aquifolium), freixos e salgueiros, criando pequenos túneis verdes onde a vida se refugia.
Mais escondidas, mas não menos valiosas, estão as turfeiras, verdadeiras esponjas naturais que armazenam água, filtram nutrientes e conservam uma biodiversidade rara.
Lameiros – Prados vivos da montanha

Como um manto verde que se estende pelo fundo das encostas, os lameiros são prados seminaturais com pastagens que se desenvolvem-se ao longo das linhas de água, aproveitando zonas com fraca aptidão agrícola, e contam com um sistema de rega tradicional por gravidade, uma verdadeira engenharia popular.
Aqui apascenta-se o gado durante parte do ano, e é também daqui que se colhe o feno que irá alimentar os animais no inverno. Graças à circulação contínua da água por pequenos canais, os lameiros resistem à geada e à neve, mesmo nos meses mais frios.
Nas suas margens crescem espécies que ajudam a consolidar o solo e a proteger a biodiversidade, como o freixo-de-folha-estreita , os choupos, o carvalho-negral, o pilriteiro, os abrunheiros-bravos e, em altitudes mais elevadas, surgem também bétulas. Estes prados são uma peça-chave do ecossistema de Montesinho, mostrando a relação equilibrada entre as comunidades locais e a paisagem natural.
Solos e rochas
A geodiversidade também faz parte do encanto de Montesinho. O solo aqui é um verdadeiro mosaico de origens: granitos, xistos, migmatitos, gnaisses e rochas ultrabásicas, distribuídos por montes, planaltos e vales profundamente escavados pelos rios Sabor, Maçãs, Baceiro e Tuela.
Aldeias de Montanha
Rio de Onor – Onde Portugal e Espanha partilham tudo
Poucas aldeias são tão singulares como Rio de Onor, onde a fronteira é apenas uma linha simbólica. De um lado, Portugal, do outro, Espanha (Rihonor de Castilla), mas para os habitantes, é tudo uma só comunidade, o povo de acima e o povo de abaixo, com um modo de vida comunitário que resiste ao tempo.
Esta aldeia comunitária é atravessada pelo rio Onor e tem como seu traço mais marcante a organização comunitária. Aqui partilham-se fornos, moinhos, a boiada (pastoreio comunitário), os terrenos coletivos, a forja do povo, e até um conselho local que se reúne para deliberar. As infrações são apontadas na antiga vara da justiça… e pagas em vinho. Quanto maior a asneira, maior a multa, e maior a festa.

A aldeia também tem um dialecto próprio, que está quase extinto, o rionorês, de base asturo-leonesa. As casas tradicionais, em xisto com varandas de madeira, mantêm a traça original. No andar de baixo, ficam os animais e os produtos da terra. Por tudo isto — e muito mais — Rio de Onor foi eleita uma das 7 Aldeias Maravilha de Portugal, na categoria de “Aldeias em Áreas Protegidas”.
O que ver e fazer em Rio de Onor
Praia fluvial – Pequena, tranquila, com águas límpidas do rio Onor — ideal para um mergulho de verão ou para descansar com os pés na água.
Moinho comunitário – Ainda em funcionamento, é um dos símbolos da vida partilhada que aqui se vive.
Casa do Touro – Espaço museológico dedicado ao passado e à cultura local. Aqui descobres como funcionava o comunitarismo, o papel do touro do povo, e as festas dos rapazes — tudo isto através de recursos digitais e conteúdos interativos. Era também nesta casa que, antigamente, se guardava o touro comunitário.
Festa dos Reis (6 de janeiro) – Rito de passagem para os rapazes solteiros, com máscaras e tradições únicas.
Carabelho – Uma espécie de tranca artesanal, rudimentar e facilmente removível. Só faz sentido em lugares como este, onde a confiança ainda é regra.
A aldeia de Rio de Onor oferece vários serviços, desde restauração a hospedagem, assim como algum comércio de produtos locais e regionais. Percorrer as ruas de Rio de Onor é uma aula viva de património, onde se aprende a viver em comunidade, e sem fronteiras.
Guadramil – A aldeia (quase) secreta

Mesmo ao lado, escondida entre montes e floresta, está a remota aldeia de Guadramil, uma aldeia raiana que parece escondida de propósito entre montes e vales profundos, mesmo no limite do Parque Natural de Montesinho. Pertence ao concelho de Bragança, mas vive como se estivesse num território à parte — isolada, preservada, profundamente enraizada na sua identidade. Chegar a Guadramil não é fácil, nem esperes rede no telemóvel.
Durante séculos, Guadramil viveu numa espécie de autonomia informal, marcada pela ausência de uma presença do Estado e por uma localização isolada, o que fez com a sua comunidade se auto-organizasse para enfrentar tempos de instabilidade e escassez. Essa condição moldou formas próprias de governação local, de partilha e até de defesa.
Apesar de estar administrativamente integrada em Portugal, Guadramil vive numa espécie de limbo territorial e cultural. A proximidade com Espanha e o isolamento histórico contribuíram para o desenvolvimento de uma comunidade com traços únicos, incluindo uma língua própria e práticas comunitárias ancestrais.
Encaixada no vale da ribeira de Guadramil, com casario em xisto bem conservado, a aldeia conserva um núcleo comunitário singular. A forja e o lagar comunitários falam de um tempo em que a aldeia era o mundo e o trabalho era partilhado em gestos de entreajuda nas colheitas e na organização coletiva das terras.
Durante séculos, aqui falava-se o Guadramilês, um dialeto que misturava elementos do português arcaico, do mirandês e do castelhano. O Guadramilês foi falado até meados do século XX, sendo hoje praticamente extinto.
A espiritualidade local encontra expressão na Igreja de São Vicente, com arquitetura tradicional em xisto, e nas festas religiosas e pagãs que moldam o calendário da aldeia.
A mina de ferro de Guadramil, oficialmente registada em 1923, é um ponto pouco conhecido mas significativo do seu património. Hematite, limonite, siderite e barite são alguns dos minerais extraídos num passado de curta exploração, condicionado pelo isolamento da região e a falta de infraestruturas. Hoje, a mina está desativada, mas continua a despertar o interesse de geólogos e investigadores.
Montesinho – O coração do parque
Montesinho não é apenas a aldeia que dá nome ao Parque Natural — é também uma das mais altas e emblemáticas de toda a Terra Fria Transmontana. Situada a cerca de 1.030 metros de altitude, esta aldeia típica está cravada no cimo da serra, rodeada por natureza a perder de vista.
As casas em granito, com coberturas em lousa negra (ardósia) e varandas de madeira, alinham-se por ruas estreitas e calcetadas. A igreja paroquial de Santo António, ergue-se acima do casario e convida à contemplação. Vale a pena percorrer as ruas da aldeia, observando as hortas muradas — as tradicionais cortinhas — e ouvir o som da ribeira do Vilar, que serpenteia ali ao lado.
A Fonte de Montesinho, também conhecida como fontanário da aldeia, é um dos elementos tradicionais que compõem o património vernacular de Montesinho. Está localizada no núcleo antigo da aldeia e é um bom exemplo de como a água era (e continua a ser) um recurso central na vida comunitária transmontana.
Nos arredores, estendem-se lameiros húmidos, soutos e carvalhais, compondo um mosaico agrícola e florestal que sustenta a vida local. E mesmo ali perto, repousam as memórias do antigo complexo mineiro do Portelo, outrora dedicado à extração de estanho.
Com alojamento rural, cafés e restaurante, é uma base perfeita para quem quer explorar o parque. Montesinho é o ponto de partida para caminhadas incríveis, como o Percurso do Porto Furado (PR3), que atravessa paisagens graníticas, bosques e lugares lendários.
Varge – Tradição e gastronomia de braços dados
Em Varge, os Caretos, com as suas máscaras de latão e fatos coloridos, saem à rua nas festas de inverno, mantendo viva uma das tradições mais antigas da região. Os artesãos da aldeia, como António Alves e Fernando Tiza, continuam a fazer máscaras à mão, em madeira, latão ou palha.
A velha Fonte do Careto, decorada com um painel alusivo à Festa dos Rapazes, é um símbolo da aldeia e da sua identidade cultural. Junto à ponte rústica sobre o rio Onor, destaca-se uma imponente máscara de Careto pendurada num poste, como um guardião silencioso da memória coletiva. O restaurante mais típico da aldeia reforça este espírito ao chamar-se também “O Careto”.

Aveleda – Ruralidade transmontana e saberes locais
Aveleda é uma aldeia ligada à terra, ao vinho e ao saber fazer. Aqui respira-se agricultura tradicional, bons enchidos e uma ruralidade que sabe receber. É também morada de artesãos como Gilberto Ferreira, conhecido pelas suas navalhas artesanais.
A paisagem circundante convida a um olhar mais demorado, entre lameiros, carvalhais e soutos, um autêntico postal da Terra Fria.
Vinhais – A vila das castanhas e dos enchidos
Mais urbana, mas ainda fiel ao espírito transmontano, Vinhais é conhecida pelos seus produtos de excelência: castanha, fumeiro, cogumelos e mel. É aqui que decorre a famosa Feira do Fumeiro, e também onde se pode visitar o Centro de Interpretação da Paisagem Protegida da Serra da Coroa — uma excelente introdução ao território montanhoso do concelho.
Vale a pena subir ao Castelo de Vinhais, de onde se obtêm vistas privilegiadas sobre toda a vila e as serranias em redor. Construído no século XIII, o castelo tinha uma função defensiva estratégica no contexto das guerras entre Portugal e Castela. Hoje, o que resta das suas muralhas e torreões faz parte de um bonito parque urbano, ideal para um passeio tranquilo com vista sobre o Parque Natural de Montesinho.
Nos arredores da vila, encontra-se o Parque Biológico de Vinhais, um espaço pensado para dar a conhecer a fauna e flora da região, com recintos de animais autóctones, percursos interpretativos, hortas pedagógicas e até um centro micológico. É um lugar ideal para famílias, escolas ou qualquer viajante curioso que queira mergulhar na natureza da Terra Fria com uma abordagem acessível e educativa.
Gimonde – À entrada do parque
Embora nem toda a aldeia esteja dentro dos limites do Parque Natural, Gimonde é uma das portas de entrada para Montesinho. Muito conhecida pela gastronomia, é morada de restaurantes emblemáticos como o D. Roberto ou o O Abel, ambos com pratos típicos e enchidos da região. Também aqui se produz o famoso presunto de Gimonde.
Logo à entrada da aldeia, destaca-se a Ponte Velha sobre o rio Onor, de origem medieval, construída em pedra e composta por vários arcos. Esta ponte histórica, que durante séculos serviu viajantes, rebanhos e mercadorias, é hoje um dos cartões-postais de Gimonde, e um ponto obrigatório de paragem.

França – Entre as aguas calmas do Rio Sabor
À chegada a França, vindo pela estrada de Rabal, a paisagem abre-se em beleza: a aldeia estende-se no fundo de um vale, encaixada entre os contrafortes da serra de Montesinho e a vasta veiga agrícola.
No subsolo, escondem-se memórias de um passado mineiro intenso: as antigas minas de ouro de França. Embora desativadas, são testemunho de um tempo em que a exploração dos recursos naturais moldava o quotidiano local.
No verão, o destaque vai para a Praia Fluvial de França, um pequeno refúgio natural com águas límpidas, uma galeria ripícola bem conservada, zona de mergulho, parque de merendas e muita sombra. E se quiseres algo diferente, marca uma visita ao Centro Hípico de França, onde podes ver de perto exemplares da raça Lusitana, agendar passeios a cavalo pela serra, alguns com travessia no rio Sabor.
De acordo com a Monografia das Freguesias do Concelho de Bragança, da Câmara Municipal de Bragança, o termo "frança" é associado por Sousa Viterbo, no seu Elucidário, a lenha miúda — a rama resultante do corte de troncos de árvores. Assim, o nome da aldeia de França pode estar ligado à abundância de árvores e vegetação na zona.
Vilarinho – Um recanto tranquilo no Parque de Montesinho
Por último, recomendamos uma passagem pela aldeia discreta mas cheia de encanto de Vilarinho. A Praia Fluvial de Vilarinho, menos conhecida, é um pequeno segredo local: tem boas sombras naturais, um acesso fácil e um ambiente perfeito para descansar à beira-rio nos dias quentes de verão. Insere-se numa zona de grande valor ecológico, onde é possível observar galerias ripícolas bem conservadas, habitats de espécies como o melro-das-rochas, garça-real e lontra. Ao redor, há muito para descobrir com calma: um parque de merendas acolhedor, um antigo moinho de água, e uma ponte tradicional, localizada sobre o rio Baceiro. Construída em alvenaria de pedra, é um dos elementos patrimoniais de Vilarinho.
A Igreja de São Cipriano marca o centro do povoado e é um ponto de encontro para as festas locais. Esta aldeia é um bom local para adquires alguns produtos locais — desde compotas e mel a pequenos enchidos — produzidos em pequena escala, com o sabor autêntico que só a Terra Fria sabe oferecer.
Vilarinho é também o ponto de partida para o Trilho do Ornal (PR4), uma caminhada circular que leva os visitantes a descobrir florestas densas, linhas de água e zonas de biodiversidade riquíssima, e sobre o qual falaremos já de seguida.
Trilhos no Parque Natural de Montesinho
Rota dos Cervídeos
Este percurso é uma das melhores formas de observar veados e corços em liberdade, sobretudo no outono, durante a época da brama, um dos espetáculos naturais mais marcantes do Parque Natural de Montesinho. São cerca de 9 km de caminhada entre zonas florestais e abertas.
Distância: 8,9 km
Tipo: Circular
Dificuldade: Baixa a média
Duração: ~1h30
Desnível acumulado: ~170 m
Ponto de partida: Largo da aldeia de Guadramil
Melhor época: Outono (época da brama dos veados)
Sinalização: Existe, mas com algumas falhas
Destaques:
Passagem por carvalhais, lameiros e campos agrícolas
Possibilidade de observar veados, corços, cogumelos e aves
Património rural: igreja matriz, moinhos, forja comunitária, lagar e fornos
Este trilho atravessa uma das zonas mais preservadas e biodiversas do parque, a área da Alta Lombada, entre Guadramil e os montes que acompanham a fronteira com Espanha. Aqui, a natureza foi deixada em paz o suficiente para manter o seu equilíbrio intacto.
A fauna local é marcada por presenças discretas mas emblemáticas: o lobo-ibérico vagueia em silêncio pelas zonas mais recônditas; os veados e corços cruzam clareiras ao amanhecer; e, nos céus, planam águia-cobreira, milhafres e outras aves de rapina.
O trilho passa por bosques de carvalho-negral, carvalho-roble e castanheiros, entremeados por galerias ripícolas, matagais e pastagens. Os solos graníticos e xistosos sustentam uma flora adaptada ao clima de montanha, com tons que mudam de estação para estação, do verde fresco da primavera aos dourados do outono.
O lado português de Rio de Onor
Este trilho circular de 7 km é ideal para quem quer caminhar com os sentidos bem despertos para a história, a paisagem e ao modo de vida comunitário de Rio de Onor. A partir do Parque de Campismo rural, o percurso desenvolve-se no sentido contrário aos ponteiros do relógio, entrando por bosques húmidos, lameiros verdejantes e caminhos rurais, e ao longo do rio Onor.
Distância: 7 km
Tipo: Circular
Duração estimada: ~2h
Dificuldade: Média
Desnível acumulado: +230 m / -230 m
Altitude mínima / máxima: 686 m / 770 m
Ponto de partida / chegada: Parque de Estacionamento do Parque de Campismo de Rio de Onor
Melhor época: Todo o ano
Âmbito: Natural, paisagístico e cultural
O percurso começa com uma subida suave por estrada asfaltada, antes de entrar em caminhos de terra que sobem até aos pontos mais altos do trilho, com vistas amplas sobre montes e paisagens agrícolas. Ao descer em direção ao rio Onor, o trilho conduz-nos à zona do Cimo do Couto de Baixo, onde se ergue um Carvalho-negral centenário, classificado como Árvore de Interesse Público desde 2012.
Segue-se uma passagem junto a lameiros férteis, por trilhos estreitos na margem do rio, onde surgem formações rochosas como a Fraga do Rio Onor e pequenas áreas de vegetação ripícola. A travessia da antiga ponte de pedra (séc. XIX) marca o regresso à aldeia — agora pela margem oposta, permitindo explorar as ruas típicas, a Igreja Matriz, os moinhos, o forno e a forja comunitária.
Se quiseres conhecer a fauna local de forma mais profunda e respeitadora, a Dear Wolf, sediada em Rio de Onor, organiza passeios guiados focados na conservação do lobo-ibérico e no equilíbrio entre comunidades humanas e vida selvagem. Mais informações em: https://dearwolf.wixsite.com/dearwolf.
Percurso do Ornal
O Percurso do Ornal (PR4) desenvolve-se entre a ribeira de Ornal (a qual atravessamos várias vezes) e o rio Baceiro, revelando uma impressionante diversidade ecológica. É um trilho com um rico património rural e pequenos detalhes que contam a história de uma região profundamente ligada à sua terra. É um percurso que surpreende pela variedade paisagística: entre caminhos de xisto, ribeiras e antigas levadas, o trilho do Ornal é uma verdadeira descoberta.
Distância: 9,5 km
Tipo: Circular
Duração estimada: ~3h
Grau de dificuldade: Médio
Ponto de partida / chegada: Aldeia de Vilarinho
Melhor época: Primavera e outono
Interesse principal: paisagístico, ecológico e etnográfico
Nas zonas de solos ultrabásicos (ricas em metais pesados), surgem azinheiras de pequeno porte e plantas raras adaptadas a condições extremas, como a arméria, arenária ou cravina. Já nas encostas mais férteis, predominam carvalhos-negral e bosques que oferecem sombra, abrigo à fauna e trilhos frescos para quem caminha. Ao longo das margens do rio alinham-se lameiros bem delimitados por espécies ripícolas — freixos, salgueiros e amieiros — e caminhos ladeados de muros de pedra solta.
A paisagem humana também marca presença. Um dos pontos altos do percurso é a passagem pelos antigos fornos de cal da Cova de Lua, utilizados até à década de 60 do século XX para transformar o calcário em cal viva — essencial na agricultura e construção tradicional. Este é também o único local do concelho onde afloram rochas calcárias. Outro destaque são os moinhos comunitários de rodízio, construídos nas margens do rio Baceiro. Dois deles pertencem à aldeia de Vilarinho e um à Cova de Lua.
Num dos pontos altos do percurso ergue-se a Capela de Santo Amaro, construída sobre os vestígios de um antigo povoado fortificado da Idade do Ferro, conhecido como Cidadelha. Este topónimo, associado à sua localização estratégica, sugere uma antiga ocupação castreja, mesmo que os vestígios arqueológicos já não sejam visíveis à superfície. Do alto da Cidadelha, o trilho oferece uma das melhores vistas panorâmicas sobre o vale do rio Baceiro.
Percurso do Porto Furado
O PR3 – Percurso Pedestre de Porto Furado desenvolve-se a norte da aldeia de Montesinho, numa zona de granito que revela afloramentos rochosos verdadeiramente belos: lajes, penedos e blocos soltos.
Logo à saída da aldeia, a paisagem é dominada por lameiros e soutos. À medida que se sobe, cruzam-se matas de carvalho-negral e até algumas bétulas, compondo um mosaico vegetal típico da Terra Fria Transmontana.
É também nesta subida que se avista o Falgueirão, um elemento geológico icónico da serra de Montesinho. Com uma forma cónica muito particular, este monte é composto por grandes pedregulhos arredondados resultantes da erosão de granitos com mais de 245 milhões de anos. Hoje, o Falgueirão está revestido por matos densos de urze, giesta, carqueja e charguaço, o que lhe dá um aspeto ainda mais selvagem.

Pouco depois, atinge-se a barragem da Serra Serrada, situada a cerca de 1200 metros de altitude, implantada no curso da ribeira das Andorinhas.

Um dos pontos mais emblemáticos do trilho é o local conhecido como Porto Furado. Aqui, os romanos exploraram ouro, e ainda se podem ver vestígios desse passado, um testemunho claro da engenharia romana no coração do que é hoje o Parque Natural de Montesinho.

Distância: ~9,5 km
Tipo: Circular
Duração: ~3h
Grau de dificuldade: Médio
Ponto de partida / chegada: Montesinho
Melhor época: Primavera e outono (evitar nevoeiro e neve)
Castro Curisco e a Fraga da Medideira
Na fase descendente do trilho, surge o Castro Curisco, uma estação de arte rupestre granítica, onde podemos observar nas rochas representações de covinhas, figuras zoomórficas e cruzes esculpidas na rocha. Algumas destas marcas são de interpretação incerta, mas acredita-se que tenham origem pré-histórica ou medieval.
É também aqui que se encontra a Fraga da Medideira — uma enorme formação onde, diz-se, as crianças da aldeia mediam a sua altura com base nas cruzes talhadas nas paredes da pedra.
Onde Comer
Gastronomia Transmontana
Na Terra Fria Transmontana, a castanha é rainha: entra nas sopas, adoça sobremesas e dá corpo a licores. Nos soutos, o outono é tempo de colheita, convívio e cheiro a terra molhada. No inverno, fazem-se os enchidos — alheiras, salpicões, chouriças de sangue e de bofes, butelos e morcelas, com sabores rústicos, curados ao fumo.
Aqui, o porco bísaro é alimentado a castanha, batata e nabo, e faz parte de uma economia doméstica ancestral. O boi mirandês, por seu lado, dá-nos uma das maiores iguarias da região: a posta à mirandesa, vinda de pastos de altitude.
Mas nem só de carne se faz a mesa. Há cogumelos silvestres, como as repolgas e os míscaros, as trutas de rio, sopa de castanha, bolo de noz e mel... A gastronomia de Montesinho é uma espécie de alquimia entre o que a natureza oferece e o que a cultura sabe preservar.
Restaurantes a não perder
Casa do Careto (Varge)
Uma das paragens obrigatórias da região. Localizado no coração da aldeia de Varge, o restaurante Casa do Coreto é conhecido pelos seus pratos feitos com ingredientes locais e cozinhados em forno de lenha. O ambiente é familiar, o atendimento é caloroso, e o sabor é genuinamente transmontano.
Restaurante Típico D. Roberto (Gimonde)
Uma instituição gastronómica desde 1935. Localizado em Gimonde, este restaurante está instalado numa casa tradicional transmontana e serve pratos típicos com enchidos da casa.
Restaurante Cepo Verde (Gondesende)
Num cenário de carvalhos e castanheiros, o Cepo Verde, serve pratos regionais com ingredientes sazonais, como repolgas com fumeiro de Vinhais ou lombo de porco com castanhas.
No seu forno de lenha tradicional, coze-se pão caseiro com farinhas locais. Em dias de cozedura, os visitantes podem assistir ao processo e sentir o aroma quente que enche o ar, tornando a refeição ainda mais especial.
O Javali (Portelo)
Recomendado pelo Guia Michelin, este restaurante é um clássico da caça e da cozinha transmontana. Tem especialidades como javali estufado, truta escabeche, cordeiro e butelo com casulas.
O Pote (Bragança)
Localizado na zona histórica da cidade, este restaurante tem um ambiente acolhedor e uma boa carta de petiscos e pratos transmontanos.
Casa da Edra (Montesinho)
O Restaurante Casa da Edra, em Montesinho, é um espaço acolhedor integrado numa casa de turismo rural, que combina bem com o espírito da aldeia. Alem de servir refeições, também vende doces, compotas e bolinhos de fabrico próprio.
Pratos típicos que não podes perder
Posta à transmontana
Butelo com casulas
Sopa de castanha
Pudim de castanha
Repolgas com fumeiro
Truta grelhada
Alheira caseira
Cultura, Tradições e Festas Locais
Estas terras conservam tradições mais antigas do que a própria nacionalidade, herdeiras de um tempo em que ainda não existiam fronteiras nem estados. Os povos peninsulares que aqui viviam antes da chegada dos romanos guiavam-se por eventos astronómicos e por uma relação íntima e permanente com a natureza. Muitos dos rituais e costumes que sobreviveram até hoje têm raízes profundas no paganismo rural, refletindo crenças ancestrais em forças naturais, na renovação cíclica da vida e no equilíbrio entre o homem e o território.

Festas de Inverno de Bragança
Do Natal ao Entrudo, uma época em que vale tudo!
Com o solsticio de Inverno, chega à Terra Fria Transmontana o ciclo das Festas de Inverno — uma época que se estende de 25 de dezembro a 6 de janeiro, cheia de cor, ruído e simbolismo. Este é um tempo de celebração comunitária que marca a renovação do ano e da própria vida coletiva.
Entre todas, destaca-se a Festa dos Rapazes, também conhecida como Festa de Santo Estêvão, um rito de passagem da juventude para a vida adulta. Os rapazes percorrem a aldeia vestidos de caretos, com trajes coloridos, campainhas e máscaras irreverentes, num ambiente de liberdade e transgressão.
“Entre 25 de dezembro e 6 de janeiro, um pouco por toda a Terra Fria, o ciclo festivo enche as aldeias de vida, ruído e cor. As figuras mascaradas — os caretos — percorrem as ruas, lançando confusão, rindo-se do poder e subvertendo a ordem.”
Em aldeias como Aveleda, a celebração começa com a recolha de lenha para as fogueiras. A 25 e 26 de dezembro, os jovens com 16 anos ou menos saem à rua vestidos com trajes exuberantes, lembrando os Caretos de Podence. Armados com cajotos (paus grossos), correm, dançam, gritam e encenam “comédias”, sátiras públicas onde se criticam figuras locais, rituais que permitem à comunidade expiar, rir e renovar.
“Durante a Missa de Santo Estêvão, os caretos ocupam um lugar de destaque no altar. Depois, tornam-se diabos à solta, encarnando a crítica e a libertação coletiva.”
As loas, os peditórios porta a porta, a música tradicional (com gaiteiro, caixa e bombo) e a refeição comunitária são momentos centrais deste ciclo. Na missa, os jovens beijam o Menino antes de todos, para depois se transformarem nos diabos festivos que desafiam o poder, a autoridade e as normas.
Saberes antigos e artesanato vivo
Montesinho é terra de máscaras e caretos, figuras arcaicas ligadas a antigos rituais pagãos. Estes disfarces não são apenas ornamentos festivos, mas símbolos de transformação social e ritual, com raízes profundas na cultura popular transmontana.
Ainda se fazem mantas de burel, colheres de pau e cestos de vime à porta de casa, com a sabedoria passada de geração em geração. Muitos artesãos estão disponíveis para uma conversa ou para mostrar o seu trabalho, mais uma expressão viva da resiliência cultural desta região.
Onde Ficar
Casas de aldeia e turismo rural
A melhor forma de viver Montesinho é dormir nas aldeias. Há casas de turismo rural cuidadosamente restauradas, com lareiras, vistas incríveis e aquele cheiro a lenha que fica na memória.
Casa da Portela – Rio de Onor
Alojamento de turismo rural de qualidade superior, com quatro quartos confortáveis, todos com casa de banho privativa, ar condicionado e Wi-Fi. Dispõe de cozinha equipada, sala acolhedora e bicicletas gratuitas — ideal para uma estadia tranquila em plena natureza.
Casa do Parâmio
Situada na aldeia de Parâmio, a cerca de 16 km de Bragança, esta antiga casa rural de dois pisos foi restaurada em 2008, respeitando a traça típica local. No interior conserva-se um antigo forno de pão, símbolo da herança comunitária transmontana. Localizada no centro geográfico do Parque Natural de Montesinho, está estrategicamente posicionada para visitar os principais pontos de interesse. A casa é arrendada na totalidade e tem capacidade para 5 pessoas.
Casa da Aldeia de França
Situada junto ao rio Sabor e em frente a uma mata de carvalhos, esta casa oferece tranquilidade, natureza e conforto. Conta com 5 quartos duplos, aquecimento central, sala de jogos, grelhador coberto e espaço exterior amplo.
A Lagosta Perdida – Montesinho
Um turismo rural original no coração da serra. Perfeito para quem quer silêncio, boa comida e estadia com personalidade. A decoração é acolhedora e cheia de charme, com pequenos luxos em ambiente de montanha.
Parque de Campismo Cepo Verde
Entre soutos de castanheiros e carvalhais, o Cepo Verde é um espaço certificado de turismo de natureza. Fica entre Bragança e o Parque Natural de Montesinho, oferecendo bungalows em madeira, zona de campismo arborizada, restaurante regional com forno a lenha e acesso direto a trilhos. Ideal para quem quer descansar no meio da natureza com conforto.
Quando ir – As Estações em Montesinho
Montesinho é terra de contrastes, e isso sente-se bem no clima. Devido à sua localização montanhosa e altitude elevada, as temperaturas variam drasticamente ao longo do ano, podendo ir dos -12 ºC no inverno aos 40 ºC no verão. Uma expressão popular resume tudo: “nove meses de inverno, três meses de inferno”. Cada estação transforma a paisagem e oferece experiências muito distintas.
Primavera em Montesinho - A estação que desperta todos os sentidos
No quotidiano das populações rurais da terra Fria Transmontana, depois das celebrações em torno do Entrudo, dá-se início a um novo ciclo de trabalho e esperança. A paisagem está no auge da sua beleza e as aldeias, embora tranquilas, revelam uma energia nova, com as hortas a crescer e os pastores de volta aos campos. É nesta estação que os carvalhais brotam os primeiros verdes, os giestais e urzais florescem, e o ar se enche de perfumes naturais. A biodiversidade explode: insetos, cerejeiras em flor. É a altura perfeita para percorrer os trilhos do Parque Natural de Montesinho, de pé ou de bicicleta.
Verão - Explorar rios e festas populares
No verão, em Montesinho, o calor aperta e os rios tornam-se refúgios perfeitos. É tempo de mergulhos em praias fluviais, de trilhos à sombra dos carvalhais e de festas de aldeia.
Para quem gosta de natureza, há caminhos para todos os gostos: a pé, de bicicleta ou a cavalo. Para os que procuram tranquilidade, há piqueniques à beira-rio, mergulhos e serões à fresca. E para os que querem sentir o pulsar das comunidades locais, o verão é a melhor altura para viver as festas populares e assistir a concertos ao ar livre.
Outono - A estação dourada de Montesinho
Depois das euforias do verão, Montesinho veste-se de ouro e cobre, e os trilhos tornam-se mágicos sob o manto colorido dos carvalhos e castanheiros. É o tempo das colheitas, das primeiras chuvas e dos aromas intensos da terra húmida. As castanhas amadurecem nos soutos, os cogumelos espreitam entre a folhagem e os veados anunciam a brama pelos vales. É uma estação que convida a longas caminhadas e serões à lareira.
Inverno - A beleza da neve e as lareiras acesas
Montesinho é um lugar feito para o inverno. O frio aperta, mas acendem-se as lareiras, juntam-se as pessoas à volta da mesa e nas aldeias regressam os rituais antigos. Nas festas de inverno saem à rua os rapazes mascarados e as gaitas de foles, mantendo viva a tradição.
O parque cobre-se de branco nas zonas de maior altitude , e os rios e riachos estão mais cheios, tornando ainda mais pitoresca a paisagem das montanhas e aldeias.
Aproveita para desfrutar do aconchego das lareiras ouvindo histórias, saborear a gastronomia local, visitar os centros históricos, os artesãos, e conhecer museus e centros de interpretação.
Programa Quimera Travel Experiences em Abril – Uma Aventura no Parque Natural de Montesinho
Em Abril, a Quimera leva-te a explorar o Parque Natural de Montesinho a fundo com várias caminhadas guiadas pela serra e aldeias mais genuínas.
Como te podes inscrever?
As inscrições já estão abertas e as vagas são limitadas! Reserva o teu lugar para esta aventura e vem descobrir o que faz de Montesinho um lugar verdadeiramente especial.
Se procuras um destino autêntico, fora dos roteiros turísticos comuns, o Parque Natural de Montesinho está à tua espera. Com paisagens selvagens, tradições vivas e uma biodiversidade impressionante, este é um dos segredos mais bem guardados do norte de Portugal.


























































































































































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